A química da mente produtiva6 min de leitura

O segredo dos funcionários mais produtivos

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Novos estudos sobre o cérebro inspiram grandes empresas a repensar a maneira como buscam formar equipes de alto desempenho

Estatísticos, psicólogos e engenheiros dedicam-se há mais de uma década a uma das metas mais ambiciosas da gigante de tecnologia Google, segunda empresa mais valiosa do mundo. Eles buscam decifrar uma questão quase existencial, sem resposta definitiva, que interfere diretamente nos resultados de qualquer companhia: qual é a fórmula de sucesso de funcionários eficientes? Mais do que isso, o que explica a química de equipes que dão bons resultados?

No final de 2014, começaram a ser compartilhadas internamente as primeiras conclusões do estudo, conhecido pelo codinome Projeto Aristóteles, em homenagem à máxima do filósofo grego de que “o todo é maior do que a soma de suas partes”. A frente contemplou a investigação de 180 equipes dentro da empresa, as quais, com rigor científico, buscaram padrões que diferenciassem os melhores grupos nos mais variados aspectos. Em geral, seus integrantes tinham os mesmos interesses? Cultivavam amizade fora do escritório?

Nenhuma das correlações desse tipo, no entanto, comprovou-se estatisticamente. A química dos times mais bem-sucedidos, concluíram os pesquisadores, está relacionada sobretudo a como as pessoas se sentem na dinâmica do trabalho, influenciadas por aspectos como a frequência e a clareza do feedback entre chefe e subordinado e até mesmo pelas expressões faciais durante os diálogos. A fórmula gira em torno do que foi batizado de “segurança psicológica”. Em outras palavras, quando os funcionários estão à vontade para expor opiniões sem ser alvo de críticas, sentem-se livres de ameaça, são informados sobre o que se espera deles e ficam confortáveis em pedir ajuda.

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O resultado deu origem a uma lista de recomendações que começa com a importância de manter contato visual nas conversas com os membros da equipe e vai até evitar buscar culpados para os problemas, focando as soluções. Presidente mundial do Google desde 2015, Sundar Pichai tornou-se o maior divulgador das novas práticas. Numa empresa formada majoritariamente por engenheiros que torciam o nariz para teorias clássicas de administração, a conclusão ganhou força não somente pela base estatística da própria companhia como também por encontrar eco em recentes descobertas da neurociência.

Inconscientemente, segundo os pesquisadores, estamos o tempo todo buscando recompensas e tentando nos proteger de ameaças. Um episódio que provoque a sensação de insegurança inunda o corpo com hormônios do estresse, interferindo no funcionamento da parte do cérebro, o córtex, responsável pela atenção e pelo raciocínio, fatores fundamentais para o bom desempenho de qualquer indivíduo, por mais brilhante que seja. Por outro lado, as recompensas desencadeiam a produção de dopamina, neurotransmissor ligado a foco, memória, entusiasmo e inclinação para assumir riscos.

O economista e neurocientista Paul Zak, diretor do centro de estudos em neuroeconomia na Universidade Claremont, estuda desde 2001 a relação do hormônio ocitocina — estimulado em equipes nas quais os integrantes confiam uns nos outros — com o aumento da criatividade, da capacidade de colaboração e da disposição de se submeter a sacrifícios. “Descobrimos que a ocitocina é a base das relações de confiança”, disse Zak a EXAME. “E a confiança gera lucro.”

A obsessão por desvendar o código da eficiência individual — e das equipes — sempre existiu. A diferença é que nunca houve tantas possibilidades de obter confirmação científica para o que a experiência demonstrava na prática. O princípio das necessidades básicas do ser humano, difundido pelo psicólogo Abraham Maslow nos anos 50, como as fisiológicas e o senso de pertencimento, ainda guia empresas de todos os portes e origens. À parte evidências empíricas, porém, havia poucos argumentos para defender a relevância de certos aspectos, em detrimento de outros, na formação de times produtivos.

As análises vêm ganhando um novo componente científico com o advento da ressonância magnética funcional, criada há 27 anos, que mostra nas imagens o aumento do fluxo sanguíneo em áreas específicas do cérebro em reação a variados estímulos externos. Existem mais de 85 bilhões de neurônios no cérebro humano. O ritmo do trabalho de decodificá-los dobra a cada sete anos desde os anos 50 — ainda assim, pesquisadores afirmam que estamos só no início. Um dos temas preferidos dos neurocientistas tem sido justamente o comportamento humano. Na última década, a psicologia passou do sexto para o primeiro lugar na lista de temas mais pesquisados por especialistas em cérebro.

No campo da economia, os estudos já demonstraram que as pessoas tomam decisões irracionais baseadas em vieses, crenças e emoções, como os conduzidos pelo psicólogo Daniel Kahneman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia de 2002 pelo conjunto de seu trabalho em parceria com o também psicólogo Amos Tversky (morto em 1996). Em 2017, o vencedor foi o economista americano Richard Thaler, por pesquisas que aprofundaram os mecanismos irracionais das decisões humanas. Na gestão de empresas, embora seja um campo que apenas começa a ser explorado, companhias pioneiras, como Google, Microsoft e a consultoria de gestão McKinsey, já se valem do que está sendo chamado de “neurociência organizacional” (veja quadro na pág. 33).

Parte das novas descobertas apenas reforça o bom senso — apesar de não ser bem isso o que se vê na prática. É o caso da importância da clareza na comunicação de metas e decisões, para reforçar o mesmo aspecto da segurança psicológica descrita pelo time do Google e por diversos pesquisadores. Estudos mostram que só 10% dos funcionários sabem qual é o papel deles na estratégia das empresas em que trabalham. Também não é novidade que comer e dormir bem é fundamental para ter um bom desempenho.

Mas a neurociência hoje é capaz de provar que a ausência desses cuidados compromete inclusive a habilidade de tomar decisões ponderadas. “A primeira condição para não afetar a capacidade cognitiva de uma pessoa é ter um sono de qualidade que passe pelos diferentes ciclos de ondas cerebrais, e não do tipo que acorda várias vezes durante a noite”, diz a psiquiatra britânica Tara Swart, que trocou o trabalho em hospitais, há quase dez anos, para fundar uma consultoria especializada em atender companhias que passam por grandes mudanças e executivos submetidos a altos níveis de pressão. Segundo ela, para desenvolver resiliência, é preciso entender e cuidar da saúde cerebral. Nos dois cursos de extensão que leciona desde 2014 na faculdade de administração do Instituto Tecnológico de Massachusetts, Tara promete ensinar a criar um padrão mental voltado para o crescimento e para a resiliência.

 

Fonte: https://exame.abril.com.br/revista-exame/a-quimica-da-mente-produtiva/


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